A gestão de recursos hídricos no Brasil ainda é um grande desafio. Ao passo em que o país é privilegiado por deter uma das maiores reservas de água doce do mundo, é também desigual e desequilibrado quando se fala na distribuição desse abundante bem. Enquanto a Bacia Amazônica, na região Norte, abriga cerca de 70% da água doce disponível no país, a maior parte da população brasileira se concentra no Sudeste e no Nordeste, onde a oferta hídrica é muito menor em relação à demanda.
Já em relação à região Sul, embora haja um equilíbrio maior entre disponibilidade e demanda, quando comparado com as regiões mencionadas, há alguns desafios específicos decorrentes de fatores climáticos, socioeconômicos e ambientais que tornam a gestão dos recursos hídricos desafiadora. Eventos de estiagem e de cheias recorrentes, expansão agroindustrial, crescimento urbano, poluição das águas por esgoto não tratado, são alguns dos problemas enfrentados e que desafiam os gestores das águas.
Esse cenário é também refletido na Bacia Hidrográfica do Rio do Peixe e Bacias Contíguas, especialmente quando se fala de eventos extremos. Num contexto geral, nos últimos cinco anos, a região vivenciou eventos que vão desde estiagens prolongadas até cheias decorrentes de chuvas intensas. Em 2020, em meio à pandemia do Coronavírus, metade dos municípios da bacia decretaram situação de emergência e sofreram perdas significativas na produção leiteira, agrícola e de fruticultura, em decorrência da falta de água (SIRHESC, 2020). Já em 2023, os municípios da região tiveram danos substanciais com o excesso de chuva: deslizamentos de terra, quedas de árvores, interdição de pontes, alagamentos e inundações de residências e comércios, perdas de culturas no campo, dentre outros (SIRHESC, 2023). Tais fatores, somados aos problemas cotidianos, tornam-se um grande desafio para o gestor das águas e elocal, o Comitê de Gerenciamento da Bacia Hidrográfica do Rio do Peixe e Bacias Contíguas - Comitê Peixe.
O Comitê de Bacia Hidrográfica desempenha um papel fundamental na gestão descentralizada e participativa dos recursos hídricos. Criado no ano de 2002, o Comitê Peixe trabalha visando garantir dois princípios fundamentais: a conservação da qualidade da água na Bacia do Rio do Peixe, fundamental para os municípios; e a utilização racional dessa água por parte de seus usuários, através do controle da quantidade de água disponível nas diversas áreas da bacia. Para isso, atua em conjunto com os diversos setores da sociedade, representados pelos usuários de água, sociedade civil e poder público.
Embora o Comitê Peixe seja muito ativo, ainda enfrenta uma grande dificuldade para promover o planejamento, controle e alocação sustentável da água: a bacia ainda não possui um plano de recursos hídricos elaborado. O plano de recursos hídricos é um documento técnico e estratégico que orienta a gestão e o uso sustentável dos recursos hídricos em uma determinada bacia hidrográfica. Por meio do diagnóstico e do prognóstico do uso da água na bacia, o Plano estabelece diretrizes, metas e ações a serem implementadas em curto, médio e longo prazos, visando à conservação da água e à melhoria da qualidade dos corpos hídricos.
O Plano de Bacia é a principal ferramenta de planejamento de um Comitê, servindo como base para a tomada de decisões. O plano identifica os problemas e as potencialidades da bacia, propõe medidas para prevenir e mitigar conflitos pelo uso da água e promove o desenvolvimento sustentável da região. Além disso, o plano oferece suporte técnico para a definição de critérios de outorga e cobrança pelo uso da água, garantindo uma gestão participativa e integrada dos recursos hídricos. Sem esse instrumento, a atuação do Comitê se torna menos eficiente e mais suscetível a conflitos e ao uso inadequado dos recursos.
A elaboração do Plano de Recursos Hídricos da Bacia do Rio do Peixe é, portanto, um passo essencial para fortalecer a atuação do Comitê Peixe e aprimorar a gestão das águas em uma região que enfrenta situações desafiadoras. Com esse instrumento, será possível não apenas garantir uma resposta mais eficiente a eventos críticos, mas também promover o equilíbrio entre conservação e desenvolvimento econômico. O desafio é grande, mas, com a mobilização de todos os setores envolvidos, a bacia pode trilhar um caminho mais seguro rumo à preservação dos recursos hídricos e à qualidade de vida da população local. Assim, o ano de 2025 se apresenta como uma oportunidade para transformar desafios antigos em ações concretas e de resultado positivo.
Texto: Me. Laís Bruna Verona - Assessora Técnica da Entidade Executiva UNC