Há mais de uma década, estudos apontam que o aumento populacional em Balneário Camboriú e Camboriú compromete o abastecimento público de água potável. Demanda não acompanha a disponibilidade hídrica da região.
Racionamento de água. Sistemas de rodízio para abastecimento público. Conflitos entre produtores, agricultores e outros usuários de águas. Comércio e turismo afetado. Desvalorização financeira de imóveis e áreas centrais. Problemas no lançamento de esgoto tratados e vários outros desafios provocados pela escassez de água. Esses são apenas alguns dos cenários que podem ocorrer caso medidas não sejam tomadas para evitar o colapso hídrico previsto para a Bacia Hidrográfica do Rio Camboriú nos próximos anos.
Com o crescimento populacional acelerado dos municípios de Balneário Camboriú e Camboriú, a capacidade hídrica da região, tanto para abastecimento público quanto para os demais usos como agricultura e indústria, está em risco. De acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2022, Camboriú possuía 103.074 pessoas, representando um crescimento populacional de 65,29%, em relação ao censo anterior de 2010. Já Balneário Camboriú, possuía 139.155 pessoas, e teve um crescimento de 28,70% no mesmo período. Juntos, os dois municípios possuem 242 mil pessoas, mas é durante o período de veraneio que os serviços ficam mais sobrecarregados.
Na última temporada, entre dezembro de 2023 e fevereiro de 2024, mais de 1,5 milhão de turistas estiveram em Balneário Camboriú, de acordo com dados da coleta de lixo do município. No entanto, esse número pode ser ainda maior, chegando a 2 milhões de pessoas, como indicou o secretário de Turismo, Thiago Velasques, em entrevista ao jornal Página 3, em março deste ano.
Estudos apontam limite hídrico entre 2025 e 2043
Há mais de uma década, pesquisadores da área de recursos hídricos apontam os riscos do crescimento populacional para o uso da água na Bacia Hidrográfica do Rio Camboriú. Em 2011, a Mestre em Engenharia de Recursos Hídricos e Ambiental Adelita Ramaiana Bennemann Granemann, publicou uma monografia pela Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI, sobre a “Determinação do limite temporal e populacional do uso dos recursos hídricos na Bacia Hidrográfica do Rio Camboriú–SC, Brasil”. O estudo indicou um cenário de insegurança hídrica, ou seja, quando a demanda é maior do que a disponibilidade de água, para o período de 2024 a 2033, considerando os diversos usos e o crescimento populacional.
Já em 2019, a dissertação de mestrado realizada pelo Engenheiro Ambiental Adailton da Silva Estácio, intitulada “Análise de medidas estratégicas estruturais para garantia da estabilidade hídrica na Bacia Hidrográfica do Rio Camboriú (SC)”, apresentou um novo cálculo técnico sobre a disponibilidade hídrica projetada. Os resultados confirmaram as estimativas anteriores: a partir de 2025, a Bacia Hidrográfica do Rio Camboriú pode sofrer uma crise hídrica, chegando ao colapso hídrico até 2043.
Na prática, o volume de água disponível para atender toda a demanda de abastecimento público, uso na indústria, agricultura, mineração, construção civil e outros setores, é insuficiente.
“A quantidade de água disponível na Bacia permanece a mesma, porém, com o crescimento do número de habitantes na região, o cenário será insustentável se medidas não forem tomadas.”, explica o Prof. Dr. Paulo Ricardo Schwingel, Especialista em Gestão de Bacias Hidrográficas e Recursos Hídricos, Presidente do Comitê Camboriú, e orientador da dissertação que confirmou os cálculos sobre a disponibilidade hídrica.
“A partir do próximo ano (2025), nós vamos entrar em um período de risco de insegurança hídrica, quando a demanda projetada é maior do que a disponibilidade hídrica. Em outras palavras, não terá água para todos”, destaca o professor.
Medidas para evitar o colapso hídrico
Segundo o Dr. Adilson Pinheiro, especialista em Recursos Hídricos e Saneamento, é urgente aumentar a disponibilidade hídrica na Bacia Hidrográfica do Rio Camboriú. “Este aumento pode ocorrer pela implantação de estrutura de regularização de vazão, armazenamento de água na bacia, ou a transposição de água de outra bacia hidrográfica, como do Rio Itajaí-Mirim”, destaca Pinheiro.
A seguir, confira outras alternativas:
Parque Inundável
Discutida há mais de 10 anos, uma das principais medidas para minimizar os riscos de um possível colapso hídrico na Bacia Hidrográfica do Rio Camboriú é a construção do Parque Inundável Multiuso no município de Camboriú. A estrutura prevê a retenção da água do escoamento em período de chuvas intensas e/ou prolongadas, com a função de controle de enchentes, e armazenamento de água para o abastecimento público em períodos de seca ou de maior demanda hídrica.
Em novembro de 2023, o Governador Jorginho Mello (SC) assinou a Licença Ambiental Prévia (LAP) para realização da obra no município. Mas as obras ainda não foram iniciadas. No começo de junho de 2024, o projeto estava na fase de contratação dos estudos previstos pela Licença Ambiental de Instalação (LAI), e no aguardo da captação de recursos pela Prefeitura para desapropriação das áreas necessárias à construção.
Reutilização da água
O reaproveitamento das águas cinzas, ou seja, a água do chuveiro, de máquinas de lavar e da pia da cozinha podem ser tratadas e reutilizadas para o uso em descargas, sistemas de irrigação, lavagem de pavimentos e veículos, e na construção civil. Assim, os municípios podem investir também em sistemas e tecnologias para apoiar o reaproveitando dessas águas, evitando o consumo de água potável para tais fins. O mesmo vale para captação da chuva, que pode ser armazenada, não apenas no Parque Inundável, mas também por outros sistemas de retenção.
Educação Ambiental
Para o Dr. Paulo Ricardo Schwingel, “desenvolver um olhar e consciência na população sobre a finitude dos recursos naturais, é essencial para garantir a segurança hídrica.”
Os programas e iniciativas de educação ambiental na região, devem priorizar o tema e reforçar a importância da preservação e do uso racional da água nos municípios.
Conservação de áreas de preservação e aumento das áreas verdes
A manutenção da vegetação é crucial para a recarga dos aquíferos e produção de água. Neste sentido, apoiar o Projeto Produtor de Água do Rio Camboriú, criado pela Empresa Municipal de Água e Saneamento de Balneário Camboriú (EMASA), bem como transformá-lo em Programa, para que o pagamento por serviços ambientais consiga abranger todas as áreas da bacia hidrográfica, seria uma medida muito efetiva pelo poder público de Balneário Camboriú e Camboriú, em conjunto com o setor privado.
O Projeto Produtor de Água do Rio Camboriú foi criado pela EMASA em 2009 e envolve práticas de conservação da vegetação nativa e a restauração de áreas degradadas através do pagamento por serviços ambientais. Em outras palavras, os proprietários das terras ganham para manter a vegetação em pé e promover o armazenamento da água no solo.
Outra medida bastante eficaz é criar mais áreas vegetadas, como os parques verdes, principalmente em Balneário Camboriú, para que as águas da chuva possam infiltrar e recarregar os aquíferos freáticos. O uso de jardins de chuva, valas de infiltração e pavimento permeável também apresentam contribuição positiva para que a água possa infiltrar no solo.
Planos de Emergência Hídrica
Por fim, outra ação necessária para os municípios é desenvolver Planos de Contingência Hídrica para situações de escassez e colapso hídrico. Tais planos devem apontar as medidas e ações necessárias para conservação da água, a partir de indicadores de níveis de risco, tais como: racionamento de água, a proibição de determinadas atividades (lavar carros e calçadas, por exemplo), ou sistemas de rodízio. Os planos devem apontar as áreas mais vulneráveis e potenciais riscos para população, entre outros detalhes.
Essas e outras medidas são essenciais para garantir a segurança hídrica para a população da Bacia Hidrográfica do Rio Camboriú.
Acompanhe as notícias e ações do Comitê Camboriú e saiba mais sobre projetos de conservação e gestão hídrica na região.
Referências:
GRANEMANN, A. R. B. Determinação do limite temporal e populacional do uso dos recursos hídricos na bacia hidrográfica do Rio Camboriú – SC, Brasil. 75 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Curso de Engenharia Ambiental), Universidade da Vale do Itajaí, Itajaí, 2011.
ESTÁCIO, A. S. Análise de medidas estratégicas estruturais para garantia da estabilidade hídrica na Bacia Hidrográfica do Rio Camboriú (SC). 127 f. Dissertação (Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia Ambiental), Universidade da Vale do Itajaí, Itajaí, 2019.